Da cidade sacra à cidade laica. A extinção das ordens religiosas e as dinâmicas de transformação urbana na Lisboa do século XIX

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Designação
Quinta dos Inglesinhos

Código
LxConv097

Outras designações
Convento dos Inglesinhos; Seminário dos Ingleses

Morada actual
Rua do Seminário, 5

Sumário
Por via a corrigir algumas imprecisões existentes em fontes de diversas épocas que apresentam o presente caso como tendo sido um convento, tomou-se a opção de criar um registo de inventário alusivo à Quinta dos Inglesinhos, ainda que não se insira no contexto do Projecto LxConventos.

Localizada na actual freguesia de Carnide, foi uma quinta de recreio de grandes dimensões pertencente aos padres do Colégio de São Pedro e São Paulo, instituição educacional gerida por padres católicos ingleses seculares. No final do século XX (em data posterior a 1987) o edifício foi demolido e toda o terreno da quinta urbanizado, dando lugar à Urbanização da Quinta dos Inglesinhos.

Caracterização geral


Data de demolição
1987 | 2000

Descrição


Enquadramento histórico
Nas "Memórias de Carnide" que publica entre 1914 e 1916, o padre José Baptista Pereira traça a história do edifício. Considerando que "parece ser edificação dos meados do seculo XVIII" (PEREIRA, 1914, p. 279), na qual em 1757 habitava o desembargador Novaes e respetiva família. "Foi n'essa quadra que fixaram residencia todos que ahi as tinham ou porque suas cazas ficaram arrazadas pelo terremoto ou porque procuravam aqui melhor garantir-se das vaticinadas repetições de abalos ou trepidações da terra" (Idem, p. 286). Dois anos depois o dito desembargador morre na quinta, numa altura em que com ele viviam mais de trinta pessoas, entre família, hóspedes e criados. Na década de 1760, D. Anna Eufrasia Sancha Ferreira da Silva Leitão, filha e herdeira do desembargador, casa com Vicente Rodrigues Pontes, ficando a casa e quinta conhecida desde então como "Quinta do Pontes", em cuja família ficaria durante quase mais um século. Durante o meio século seguinte terá sido regularmente habitada ou servindo de casa de veraneio a membros da família. Entre 1825 e 1832 foi alugada a uma instituição de ensino de surdos-mudos. "Foi pelos annos de 1840 que, tendo chegado a caza e quinta dos Pontes ao derradeiro estado de abandono, o internuncio Di Pierto, que a comprou por muito baixo preço, veio installar-se ali, onde viveu por muitos annos, por tantos quantos, quasi durou sua enviatura n'esse reino [...] empregando os compridos dias de verão em passeios nas suas esplendidas ruas de buxo, que por completo as sombrea, formando abobadas espessas de verdura, por onde difficilmente côa um raio de sol. Para as estiradas noites de inverno, tractou elle de formar na vasta quadra que fôr caza de jantar, e, quiçá, sala de calorosas discussões politicas, uma variada livraria, aproveitando a do exincto convento de S. João da Cruz e outras. Aqui vieram tambem parar, em sua quasi totalidade, os livros que o illustre Avellar Brotero, com muito tempo e dispendio, conseguira reunir em sua demorada residencia de Pariz. [...] Em 16 de novembro de 1851 administrou Di Pietro o Santo Chrisma, no seu oratorio, convertido hoje em boa capella, a oito pessoas, que foram quantas concorreram ao acto. Em 1855, terminada sua enviatura, vendeu a quinta e caza aos padres inglezes [...], e onde os alumnos veraneam com grande satisfação, pois podem, terminadas as horas de estudo, entregar-se a longos passeios nos bellos arrabaldes de Carnide, passeios compridos, hygienicos, como elles gostam de dar, ou a jogos que lhes desenvolvem e enrijam os musculos" (Idem, pp. 284-285). Segundo a mesma fonte, os alunos passavam aí os meses de julho e agosto.

Caracterização arquitectónica
Nas Memórias de Carnide publicadas entre 1914 e 1916 pelo padre José Baptista Pereira surge uma breve descrição: O edificio, attenta sua construcção pesada, parece ser edificação dos meados do seculo XVIII, feita, talvez, sobre as ruinas d'algumas pequenas cazas que o terremoto grande destruiu [...]

Nada [...] de notavel tem a referida caza, que tem a larga frente de oito janellas, virada para o sul, d'onde se descobre um panorama lindissimo e muito variado. Sua capella, muito elegante e aceiada, foi accrescentada por seus actuaes possuidores, sendo a obra de madeira, em estylo ogival, geralmente empregado em construcções similares em Inglaterra, e a pintura, a tempera do tecto e paredes, tudo feito pelos educandos da caza, nos dias e horas de descanço. De artista apenas lá se vê o retábulo - a Sagrada Familia - pintura em tela de soffrivel desenho e execução.

De toda a caza mal se destaca, por sua grandiosidade e vastidão, a sala da livraria, sala que antes de ter o actual destino, mais vasta foi, pois roubaram-lhe uma parte para n'ella fazerem sala de recepção de visitas. Diz a tradição que esta vasta sala, com arcos sustentados em columnas de ordem jonica, e envidraçados, deitando sobre a camposa quinta, era casa de jantar. Faria honra a edificio mais espaçoso e nobre, tal é a sua amplidão.

Era n'este vasto salão, tijolado ao modo antigo, que, em tempo, segundo a mesma tradição, se reunia a fina flôr do partido legitimista para discutir e deliberar sobre da marcha a seguir. [...] Afastada de Lisboa por uma legoa apenas, em tão vasta quadra, no interior do edificio, podiam as discussões attingir o mais alto diapasão, que, por certo, os não icommodaria [sic] a policia (PEREIRA, 1914, pp. 279-280).

Cronologia


1760 - década Anna Eufrasia Sancha Ferreira da Silva Leitão, filha e herdeira do desembargador, casa com Vicente Rodrigues Pontes, ficando a casa e quinta conhecida desde então como "Quinta do Pontes", em cuja família ficaria durante quase mais um século.
1757 Vivia na quinta o Desembargador Manoel de Novaes da Silva Leitão.
1825 | 1832 O edifício é alugado a uma instituição de ensino de surdos-mudos.
1841 O internuncio Di Pietro compra a quinta à família Pontes, em cuja posse a propriedade terá estado durante cerca de um século.
1855 Os padres ingleses compram a quinta ao internuncio Di Pietro.
1987 | 2000 Demolição do edifício e urbanização dos terrenos da quinta.

Fontes e Bibliografia


Cartografia

Instituto Geográfico Cadastral; - [Planta da Cidade de Lisboa,1950]. 1/1000. 238. MP 4100 (1C) a MP 4343 (16 U).

Instituto Geográfico Cadastral; - [Planta da Cidade de Lisboa,1970/1983]. 1/1000.

PINTO, Júlio António Vieira da Silva; - [Levantamento da planta de Lisboa, 1904/1911]. 1: 1000. 249 plantas; 80 X 50cm, Planta 9F (Fevereiro 1911).

Monografia

PORTUGAL, Fernando; MATOS, Alfredo de - Lisboa em 1758. Memórias Paroquiais de Lisboa. Lisboa: Publicações Culturais da Câmara Municipal de Lisboa, 1974, pp. 104, 309 e 320.

Periódico

PEREIRA, José Baptista - Memórias de Carnide. O Instituto: Revista Scientifica e Literária, Volume 61º. Coimbra: Imprensa da Universidade. 1914.

Material Fotográfico


Quinta dos Inglesinhos | Exterior | Fachada sul. A78027.
© CML | DMC | Arquivo Municipal de Lisboa.

Quinta dos Inglesinhos | Exterior | Fachada sul. A78028.
© CML | DMC | Arquivo Municipal de Lisboa.

Quinta dos Inglesinhos | Exterior | Fachada. A58792.
© CML | DMC | Arquivo Municipal de Lisboa.

Quinta dos Inglesinhos | Exterior | Fachada. A58793.
© CML | DMC | Arquivo Municipal de Lisboa.

Quinta dos Inglesinhos | Levantamento Cartográfico - IGC (1950).


Inventariantes


Tiago Borges Lourenço - 2015-08-18


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 Data: 2024-11-21